Tendo chegado ao conceito de frequência na primeira parte deste ensaio, permito-me agora uma segunda analogia que é naturalmente, com a música, procurando desenvolver uma especulação que integra a perceção de status social.
Começando pelo básico: os instrumentos mais pequenos emitem sons relativamente mais agudos do que os instrumentos maiores. Mais agudos significa que vibram numa frequência mais alta. Mais grave significa o oposto, ou seja, que os instrumentos maiores (mais graves) vibram numa frequência mais baixa.
Se observarmos a disposição dos músicos numa orquestra, os instrumentos mais agudos ficam mais próximos do maestro (e do público) e os mais graves ficam mais distantes. As razões são principalmente de natureza acústica, sendo que as vibrações mais graves propagam-se por uma distância maior, mas também para que os músicos não obstruam alinha de visão uns aos outros com o seu instrumento. Por outro lado, instrumentos como os metais evoluíram para compensar essa distância para materiais e técnicas de construção que aumentam significativamente o volume possível bem como a capacidade de projeção do som.
Mas falemos agora de densidade musical.
Os instrumentos mais pequenos implicam uma menor amplitude dos gestos necessários à produção de cada nota facilitando, com isso, uma execução mais rápida, mais virtuosa e deslumbrante. Esta natureza comparativamente mais virtuosa cativa historicamente mais compositores, instrumentistas e público, e resulta numa produção musical fervilhante, com mais obras e de melhor qualidade estética, e num maior protagonismo dos artistas.
Em suma, não só os instrumentos mais pequenos vibram em frequências mais altas, como acabam por estar, pelas razões apresentadas, no epicentro cultural, numa rede de alta frequência de pessoas e eventos. Outras razões contribuem naturalmente ou não poderíamos explicar a presença também dominante do piano, à margem desta relação de escala (mas não do virtuosismo). Neste contexto, os instrumentos maiores acabam por vezes relegados à esfera do excêntrico e do pitoresco.
Desta confluência de fatores: o virtuosismo exuberante, a maior visibilidade e proximidade com o público, a popularidade junto das elites, contribuem para diferenças de status entre os músicos, uma vez que proximidade pode traduzir-se em acesso. Esta diferença de status não é explícita e estará bastante matizada no momento cultural presente que privilegia um pouco mais as franjas da sociedade, as tribos.
Neste ensaio (como noutros) assumo a associação livre como principal dispositivo mental, que me permite usar as palavras como portais entre os vários contextos explorados. Ainda que sinta como reais as observações apresentadas, não pretendo produzir um enunciado determinístico, mas apenas explorar a relação possível entre a frequência e o status, entre a margem e o marginal.