As Crónicas

Continuo esta semana a partilha de algumas das fotografias resultantes da Turné 2020 da Galeria Local. O objeto do ensaio realizado foi a area ardida em sete dos dez maiores incêndios de 2020.

Realizámos entre 9 e 17 de outubro, a Turné 2020, a primeira da Galeria Local. Foram 9 dias de viagem pelo interior norte de Portugal para concretização de um ensaio fotográfico sobre os incêndios florestais. O itinerário foi elaborado por forma a passar pelas localidades anfitriãs de sete dos dez maiores incêndios do Verão de 2020, em termos de área ardida.

Numa das ruas centrais vejo uma porta aberta, uma sala iluminada, um homem de pé especado, como que ancorado a uma pequena televisão tremeluzente. Dirigi-me a ele. Tentei explicar o que me levara ali, tentei contar o episódio inusitado na montanha, mas devo ter soado incongruente, assustado. Ele interrompe Mas o que quer agora, para onde quer ir? O quê? Dormir no carro? Tenho aqui quartos e camas, muito espaço!

Procurei manter a calma, recuperar do susto. Lembrei-me de uma vez na Costa da Caparica em que fiquei preso numa corrente forte e não conseguia voltar para o areal apesar de ter pé e saber nadar. Tudo está bem, não corres risco de vida. É apenas um percalço inconveniente que se resolverá pela manhã na pior das hipóteses, disse para comigo. Estava preso na montanha no meio de pedras e cactos, na escuridão total. Não tinha rede ou internet, mas tinha comida e abrigo.

A estrada fundia-se com a montanha de forma impercetível e elegante, mas era a Montanha (Serra do Reboredo) que falava agora mais alto. Quando me apercebo estava numa ‘via’ absolutamente incirculável, totalmente imprópria para um automóvel, citadino ou outro, cercado por pedras e cactos. numa escuridão total. Chegou ao seu destino, anunciava o GPS.

Seis e meia. Acordo e subo até ao parque eólico para tomar o pequeno almoço e dar início à sessão. A proximidade com as torres, que se multiplicam pelo topo da montanha até à linha do horizonte, a rotação motivada dos aerogeradores, a noite que se começa a diluir, inspiram de forma síncrona o meu pasmo perante tamanha monumentalidade.

Descer por estradas e arruamentos vertiginosamente estreitos, sendo rapidamente devolvido à montanha (citando o artigo sobre a sessão em Cunqueiros), é experiência comum nesta viagem. O que não é tão comum é oferecerem-nos um pão caseiro feito em forno de lenha tradicional no contexto de um pedido de informação de 20 segundos. E sim, estes dois eventos coincidiram!